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VERÃOZÃO 5
VERÃOZÃO 2024
por Vitor Wutzki
O inicio de um novo idioma: subimos a montanha para ver a lua cheia, vagalumes e luciérnagas voando juntos, Noites de Papel, "Amor Fantasmal", tenda de bambu, 2 de fevereiro, rio azul.
Quando vou a algo como uma residência, meu receio pessoal é o de me perder um pouco nos outros. Costumo levar algum tempo até conseguir focar e me dedicar a algum trabalho que queira realizar. Esse tipo de autopercepção parece uma besteira quando lembro do fluxo dos dias na fazenda São João: ambiente acolhedor, fértil em ideias, práticas e encontros, que se tornou para mim um tipo de casa.
Vou recorrer às fotos salvas no meu celular para lembrar, ainda que de forma bastante lacunar, desses dias em que criamos juntos um rio azul. Peço desculpas de antemão pela ausência de atividades, trabalhos e momentos igualmente importantes e deliciosos.
1. Há uma vara de madeira suspensa sobre a cabeça das pessoas. Uma vela derretida em cima. É dia de “Portas Abertas”, evento em que a residência se prepara e se abre para a visita dos moradores da região. Maya, filha de Samantha, está contemplando a vela, boquiaberta, junto de Wo. Angélica, com as mãos para o alto, está arrumando o cabelo. Ao fundo, a capela onde Fujioka exibe sua instalação. O ambiente da capelinha colonial se transformou numa espécie de caverna quente e úmida onde um ritual acontecia. Elementos do candomblé e da escrita japonesa pareciam se fundir num território estético comum. O sal, um dos elementos mais presentes no cenário, escrevia frases que se repetiam e se desmanchavam no chão. Na caixa de som, a voz de um ancião entoava um canto para Iemanjá (ali chamada por outro nome, talvez mais primitivo, que não me recordo).
2. Série de desenhos que fiz com Ana Caro estava colada na parede da Casa Figueira, também exibidos na mostra de Portas Abertas. Essa série começou com um poema de Sérgio Watanabe, “Animal de Inverno”, lido por Ana Pau e Rafael. Quando decidimos desenhar a partir desse texto, estávamos ambos com lápis azuis na mão, de tons diferentes. Desenhamos com essa limitação cromática e cegamente uma série de desenhos a partir de poemas. Com esta limitação cromática, fizemos desenhos cegos inspirados pelos poemas.
3. Uma mandala humana, organizada por Mona e Roberta, com os corpos deitados no chão em Shavasana, formando um circulo.
4. Wo subindo a montanha com sua máquina fotográfica.
5. Ana Caro subindo a montanha.
6. Roberta, Mona e Nancy subindo a montanha.
7. Oto contemplando a vista.
8. Mariana, Martín, Ana Pau, Mona, Maíra, Rafa e mais alguém, tapado pelo corpo de Mari, subindo a montanha. Era fim de tarde e subíamos a montanha para ver o nascer da lua cheia.
9. Fujioka subindo a montanha com um galho na mão.
10. Chegamos no ponto alto da montanha, estamos deitados. Bruno está improvisando uma música com pequenos sintetizadores. Estamos esperando a lua. Gabriel e Lidia apontam para o céu, Ana Pau está sorrindo. Mari e Rafa de olhos fechados.
11. Anoiteceu. Ana Caro com o rosto desfocado pela foto em movimento. Estamos no caminho de volta da montanha. A lua ficou atrás das nuvens e não apareceu muito pra gente. Isso me lembra a história do haicaista Bashô, que atravessou o pais a pé para ver a lua cheia do alto do templo Kishiga. Ao chegar lá, uma noite de chuva intensa. Bashô se dedica então, a desfrutar dos haikais feitos pelos amigos e a contemplar a paz do aposento monástico.
12. Scooby Arturis no tapete. Enquanto desciamos a montanha, havia um som crescente, uma música perfeitamente mixada. Era o sistema de som que Bruno, Diogo e Ynaiê haviam preparado para uma festa na garagem. Efeitos no microfone, beats e alguns instrumentos montados fizeram uma noite de karaokê dub e improvisações coletivas, regadas pela cerveja artesanal de Javi.
13. Antônio, com um paninho, parece lustrar a imagem projetada na parede branca da biblioteca. Foi o dia da exibição do filme dirigido e atuado por Wo, “Sr . Woman”. Algumas frases desse filme não saem da minha cabeça: “Maybe it’s a beautiful word”.
14. Ana Caro, Gabriel, Lidia e Nancy, na sala de estudos. Talvez organizavam a primeira “Noite de Papel”, encontro de leitura e produção de textos. Muitas imagens de poemas lidos nessa noite ficaram guardadas em mim. O javali que aparecia frequentemente nos sonhos, de Rafael; o escorpião que se converte em luciérnaga, de Caro; o Sol del Jaron, de Martin, entre outras.
15 A capa do livro “La Libertad de los Bares”, de Cecilia Pavón.
16. Mari Romano tocando violão nas pedras da piscina. A foto estourando o flash. É aniversário de alguém. “El cosechero” é tocada pela primeira vez. Ana Caro ao fundo com um pau de chuva. Wallace tocando percussão, sublime.
17. Letra inacabada da canção "Hotel Coração Partido", que compus durante a residência. Nesse esboço ainda havia versos que cairam na versão final, como “você é o demônio disfarçado”.
18. Página do zine “Todas as bicicletas que tive”, de Powerpaola. Eu fiquei tocado com a frase: "Dibujar o escribir sobre alguien es porque esta persona te importa. Es una manera de amar, de invocarla telepaticamente y materializarla a tu modo."
19. Gabriela e Laura gargalhando. Ao fundo, um quadro com desenhos e escritos. Foi uma improvisação musical conduzida por Gabriela, Verônica e eu, a partir de algumas orientações do compositor Stockhausen. Com zoom, é possivel ler o quadro:
"Toque uma vibração no ritmo do universo. Toque uma vibração no ritmo do sonho. Toque a vibração no ritmo do sonho e lentamente transforme-a no ritmo do universo. Repita isso o quanto puder."
20. O letreiro da exposição de artes visuais “O Corpo não tem paredes”, na Casa Figueira.
21. Um pote de cerâmica no banheiro com conchas coloridas. Numa delas está escrito “Miracles 2018”.
22. Bastidores do filme "Coraçao Fantasmal". Maira está armando o cabelo de Mona na sala verde.
23. Laura e Gabriel segurando microfones na sala verde (som direto).
24. Ana Caro com fones de ouvido, escutando a gravação de "Hotel Coração Partido", que acabara de realizar na capela da casa.
25. A tenda de Nathalie no jardim: uma estrutura feita com bambu e véu, onde se encontravam também algumas das práticas realizadas na residência: a pesquisa com o bambu de Marina e Maira, o poema coletivo realizado nas Noites de Papel, a experimentação sonora de Stockhausen conduzida por Gabi, entre outras.
26. Uma mãozinha de brinquedo está sobre a mão de Rafa. Nesse dia, ele me contou que o filme "Sociedad de La Nieve", no qual atuou e que eu havia assistido dias antes de ir à residência, foi gravado na Espanha. As montanhas dos Andes foram adicionadas posteriormente no Photoshop.
27. Antonio comendo um lirio-do-brejo na cachoeira.
28. 2 de fevereiro. Deixamos flores na cachoeira, numa procissão.
29. Gabriel Edé e Mari Romano tocam suas composições à luz de velas. Suas sombras produzem chifres na parede. Era o encerramento do Portas Abertas. Oto também cantou uma canção que falava sobre um "river", um rio.
30. 6 bordados da Ana Pau na parede da exposição "O Corpo não tem paredes".
31. A mesa do ateliê de Johana na Casa Figueira.
32. Take fumando na mesa.
33. Descasco uma abobrinha. Alguns dos melhores pratos que já comi foram nessa cozinha. É difícil separar o sabor das comidas dos momentos em que foram preparados e saboreados. Conduzidos por Nancy, grupos se alternavam na cozinha. Não esqueço do homus roxo, da salada de pepino com iogurte e algo mais que acompanhava tudo isso.
Angélica e Caro se abraçam, dizendo: “irmãs andinas”. É o dia da despedida.
Eis o rio azul:
Ana Caro. Ana Pau. Angélica. Antonio. Benoit. Bruno. Diogo. Francisco. Fujioka. Gabriel. Gabriela. Gise. Javi. Johanna. Laura. Lidia. Marcelo. Maira. Marina. Mari Romano. Martin. Mohamed. Monaliza. Nancy. Nathalie. Oto. Rafael. Roberta. Thainá. Take. Verónica. Wallace. Wo. Ynaiê
fotos por Wo Portillo del Rayo
























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